Fevereiro 2021 | E-Business Day Winter Edition [Entrevista aos docentes]

No passado dia 8 de fevereiro estivemos presentes no E-Business Day - Winter Edition e quisemos saber um pouco mais sobre a perspetiva dos docentes Arlindo Dias e Rui Alves, acerca dos resultados desta edição, cujo desafio juntou as tendências de um mundo cada vez mais digital com a urgência de tornar a economia cada vez mais circular.


IPStartUp - Nesta edição do E-Business Day, foi lançado aos estudantes o desafio de ligarem os negócios digitais às tendências da economia circular. Como foi esta experiência?  

Arlindo Dias e Rui Alves -  A experiência foi muito boa. Foi mais um dos muitos desafios “fora da caixa” que lançamos aos nossos estudantes todos os semestres. Na unidade curricular de E-Business é proposto aos alunos a realização de um trabalho (designado Projeto Digital) onde, organizados em grupo, trabalham uma ideia de negócio tecnológico, sempre enquadrada num tema e onde as apresentações finais culminam num evento ao estilo “startup battle” a que chamamos “E-Business Day”. No semestre passado associamo-nos ao projeto “+Negócios-Desperdício” e lançámos o desafio aos nossos alunos: os Projetos Digitais realizados nas aulas de E-Business teriam como enquadramento o ambiente, a ecologia, a sustentabilidade e a economia circular. Pela primeira vez, em muitos semestres, tínhamos um tema concreto e associado a um projeto real. Até aqui os alunos tinham toda a liberdade para enquadrarem uma qualquer ideia, ou problema, que conseguissem mapear com um projeto de cariz tecnológico e que fosse sustentado num modelo de negócio digital. Tivemos algum receio de que isso pudesse limitar a criatividade dos alunos, mas na realidade, todos os nossos receios comprovaram-se como infundados. Inclusivamente, foi uma forma de facilitar e tornar mais homogéneo o resultado dos trabalhos, até em termos de comparação, sendo que os princípios estavam claros logo à partida, o problema genericamente estava já identificado e bastou apenas ir à procura de soluções. E o facto é que neste último E-Business Day tivemos mais uma prova da qualidade dos nossos estudantes. Os projetos finais foram a concurso e foram avaliados, como é habitual, por um júri externo à unidade curricular, composto por convidados de diversas áreas ligadas aos negócios tecnológicos e também por alguns docentes que convidámos. Todos foram unanimes em referir o E-Business Day como um evento de muita partilha de conhecimento e de capacitação dos nossos alunos para enfrentar desafios empreendedores e com grande enfase na procura de soluções tecnológicas para problemas ambientais e de sustentabilidade. 

Em resumo, e de uma forma geral, diríamos que o maior desafio em E-Business tem sido observarmos gradualmente os alunos a saírem das suas zonas de conforto e a desenvolverem trabalhos de intensa pesquisa e criação de ideias em áreas pouco ou nada exploradas por eles. É uma experiência desafiante, não só para os estudantes, mas também para nós, docentes, pois há todo um processo de acompanhamento, motivação e orientação para que todos se sintam devidamente empenhados e focados em criar algo de novo.  

IPStartUp -  Ao longo dos anos vão trabalhando com centenas de estudantes de diferentes áreas de especialização, dentro das Ciências Empresariais. Que principais conclusões têm tirado em relação ao potencial criador e empreendedor destes estudantes?  

Arlindo Dias e Rui Alves - Sendo E-Business uma unidade curricular muito focada no empreendedorismo digital, nós, enquanto docentes, um dos princípios que trabalhamos mais nas nossas aulas é a estimulação do pensamento criativo, da capacidade para pensar “out-of-the-box”. Acreditamos que a inovação e a criatividade devem ser motivadas e estimuladas. As competências estão nos alunos, nós só temos que as potenciar, ajudá-los a pensar e a trabalhar de forma estruturada. É por isso que utilizamos em aula muitas técnicas de design thinking, por exemplo, que ajudam bastante em todo esse processo. E o resultado é que muitos dos nossos alunos que, no início do semestre, se mostram menos propensos a este modelo pedagógico, são os que, por vezes, mais nos surpreendem no final. Digamos que é um processo de descoberta de ambas as partes, com abertura e ênfase para uma criatividade consciente, bem como o estímulo para um trabalho de grupo efetivo com partilha de ideias, acima da partilha de tarefas.  

A metodologia que utilizamos, mesmo quando aplicada a estudantes de diferentes áreas de especialização, tem contribuído muito para despertar o espírito empreendedor e criativo nos nossos estudantes. É preciso notar que a unidade curricular de E-Business na ESCE não é frequentada por alunos de cursos tecnológicos e que, para muitos, o processo de idealizar um negócio digital não é tarefa a que estejam habituados. Este semestre tivemos alunos das licenciaturas de Gestão de Recursos Humanos (diurno e pós-laboral) a trabalhar em projetos digitais, todos concluídos com grande sucesso e com uma enorme probabilidade de aplicação prática nas áreas referidas. Esse é outro dos desafios que fazemos aos nossos alunos: serem capazes de criar algo de útil para a sociedade usando tecnologia. Daí o termo “criatividade consciente”. Mais interessante ainda é que alguns desses trabalhos estão já a ser alvo de avaliação para a sua integração no concurso Poliempreende e alguns até já para a IPStartUp. Esta é, aliás, a parte que nos deixa mais realizados enquanto docentes. É ver que os nossos alunos trabalharam em ambiente académico para criar algo que pode ser convertido num projeto real e exequível do ponto de vista de negócio.  

Talvez sejam muitas destas razões que, apesar de E-Business ser uma unidade curricular optativa, tem gerado muito interesse por parte dos alunos da ESCE que depois de frequentá-la conseguem, não só, entender melhor a importância da tecnologia e dos modelos de negócio associados à economia digital, mas também perceber como se pode pegar numa ideia e transformá-la num produto ou serviço inovador e real. É o princípio do learning by doing aplicado ao empreendedorismo digital. E talvez fosse interessante ver esta unidade curricular de E-Business como oferta optativa em outros cursos da ESCE e também, porque não, em outros cursos de outras escolas do IPS. Deixamos aqui o desafio. 

IPStartUp - A componente digital é cada vez mais importante quando se pensa um negócio. Como é possível identificar as várias tendências num mundo em constante mudança?  

Arlindo Dias e Rui Alves - Na história da humanidade já vivemos a revolução agrícola, há mais de 10 mil anos, a industrial, mais recentemente, mas em nenhuma delas questionámos o “efeito humano” na nossa sociedade de forma tão presente como agora. É o que muitos cientistas chamam de Antropoceno. A atual revolução digital, a utilização massiva de tecnologia nas nossas vidas, o facto de vivermos rodeados de produtos e serviços digitais, seja no trabalho, no estudo ou no lazer, tudo isto reflete o “efeito humano” no planeta e na sociedade, que é muito mais vasto. 

Relativamente à tecnologia é fundamental, por isso, tirar partido das suas vantagens, mas também ter consciência dos seus riscos. De tal maneira que é cada vez mais importante entender melhor essas mesmas tecnologias e caminhar para uma maior literacia digital, seja ao nível pessoal seja ao nível empresarial e dos negócios. Numa escola de Ciências Empresariais é fundamental a consciência dos impactos da tecnologia na gestão, nos modelos de negócios e em todas as vertentes envolventes. Por isso a importância que assume uma unidade curricular como E-Business que, com o seu modesto contributo, tem ajudado a capacitar os alunos de um melhor entendimento do digital, tão importante para estudantes de áreas não tecnológicas. Esta consciente preocupação é transversal a todos os setores da nossa sociedade atual, seja na componente científica ou na componente puramente empírica ou operacional. Por isso achamos que “aprender” tecnologia é fundamental em qualquer área científica, em qualquer curso.  

Não existe avanço científico, económico ou social sem democratizar a tecnologia. Se analisarmos bem, hoje em dia poucos são os negócios que conseguem operar sem algo tecnológico. Desde o típico e tradicional restaurante à livraria online, todos fazem uso de algum tipo de recurso tecnológico. E não foi preciso uma pandemia para se chegar a esta conclusão. Novos modelos de negócio digitais, disruptivos na sua abordagem ao mercado ou na forma como utilizam a tecnologia para criar vantagem competitiva, têm vindo a ganhar terreno a muitos negócios, ditos, mais “tradicionais”. Por isso é importante qualquer empreendedor estar atento às tendências tecnológicas porque são um dos grandes fatores de mudança nas economias atuais. Uma tecnologia como, por exemplo, a Inteligência Artificial, que muitos de nós achamos ainda ser ficção científica, é utilizada nas mais diversas áreas de negócio: no turismo, nos serviços de entrega, no marketing digital, ou até na criação de vacinas em tempo recorde, como foi o caso das vacinas contra a Covid-19 onde a IA teve um papel importantíssimo na aceleração de todo esse processo. Há dez ou vinte anos atrás não existia capacidade computacional desenvolvida o suficiente para tal. Mas hoje há e no futuro haverá muito mais e tudo está a acontecer cada vez mais rápido. 

Então como é possível identificarmos as várias tendências tecnológicas e digitais num mundo em constante mudança? Bem, a resposta não é fácil. Mas talvez procurar estar informado, ler bastante sobre tecnologia, ouvir especialistas na matéria e ir acompanhando, de algum modo, as evoluções tecnológicas, possam ser parte desse processo. Na unidade curricular de E-Business, por exemplo, realizamos com alguma frequência muitas palestras, a que chamamos “E-Business Talks” e onde tentamos trazer sempre gente especialista em várias áreas do mundo digital para que os nossos alunos possam contactar com o tema e ficar a saber mais como a tecnologia anda a ser aplicada nos negócios e nas nossas vidas. 

IPStartUp -  Qual a importância dos desafios da IPStartUp para vós enquanto docentes? Como encaram a ligação entre a incubadora do IPS e esta unidade curricular? 

Arlindo Dias e Rui Alves - Como docentes desta unidade curricular, diríamos que E-Business e a IPStartUp fazem uma excelente parceria. Parceria essa que foi iniciada há alguns ano e que começou com uma visão comum: ajudar a potenciar o capital empreendedor na Comunidade IPS. Às vezes fala-se muito em “empreendedorismo” e em potenciar o “espírito empreendedor” nas escolas e nos jovens, mas depois faz-se pouco. Felizmente, no IPS, essa não é a realidade porque existem organismos, como a IPStartUp, que trabalham muito para potenciar o “espírito empreendedor” na comunidade de estudantes. Mas também sabemos que isso não chega. Na nossa visão como docentes, tem de existir maior envolvimento das diversas escolas e unidades curriculares a colaborar com a IPStartUp de modo a potenciar ainda mais esse capital empreendedor. Ambos somos professores no IPS (na ESCE) mas também estamos ligados, por motivos profissionais, aos negócios digitais e ao apoio a startups. Sabemos que a cooperação e a partilha de conhecimento são essenciais para todo o processo de transformação de simples ideias em potenciais negócios. É nessa perspetiva que na unidade curricular de E-Business vemos essa ligação à incubadora do IPS: potenciar e capacitar ideias. 

Outros dos fatores importantes desta ligação à incubadora do IPS, diríamos, tem sido a sua participação nos eventos E-Business Day, contribuindo muito para dar a conhecer os recursos que a IPStartUp disponibiliza e também mostrar aos alunos que um “simples” projeto numa unidade curricular pode ser aproveitado como uma potencial ideia de negócio. Mas aí está, talvez, o maior desafio que enfrentamos em conjunto seja os nossos alunos conseguirem concretizar o "next step". Queremos com isto dizer que tantas têm sido as ideias que surgiram em E-Business que muitas teriam condições para avançar para um estágio seguinte de criação de negócio, algo que não tem ocorrido com a frequência que gostaríamos. Só muito poucas têm feito o seu percurso para a IPStartUp ou para o concurso Poliempreende, onde depois passam a integrar uma estrutura de apoio mais dedicada e focada e onde podem obter outras capacitações importantes para gerar um negócio. Certo é que na maioria dos casos, são os alunos que acabam por não dar seguimento às ideias para além do que fizeram na unidade curricular, por vários motivos: ou porque não estão preparados, ou porque têm medo de arriscar, ou porque têm outros objetivos de vida e profissionais, etc. Mas é certamente algo que temos que melhorar e é por isso que a unidade curricular de E-Business e a IPStartUp, em conjunto, estão a trabalhar para que muitos dos projetos que ficam apenas por trabalhos académicos possam, na realidade, se tornar, efetivamente, em algo mais.  

Porque não envolver os nossos alunos em projetos que possam potenciar a criação de negócios inovadores? Porque não estimulá-los a acreditarem nas suas ideias de negócio, trabalhá-las e depois concretizá-las? Porque não deixá-los a pensar: why not, porque não? E porque não desenvolver isso numa parceria entre uma unidade curricular e uma incubadora de startups? Esse é o desafio que queremos. Não só para E-Business, mas gostávamos muito que outras unidades curriculares seguissem o mesmo caminho. Há muito potencial empreendedor nas várias escolas do IPS. Nos seus alunos, nos seus docentes. É tudo uma questão de foco e maior colaboração. Esta é a nossa visão.